No começo, quando nos propomos a fazer uma revolução cervejeira, nós, como mercado, abrimos um leque de opções que antes eram pouco acessíveis ao público em geral.
Embalados pela revolução americana onde em cada região do país surgiam cervejarias, pessoas, propuseram um novo modo de ver a cerveja antes vista apenas como clara, inodora e insípida. Vieram as artesanais cheias de vitalidades com suas cores, sabores e aromas e o meio cervejeiro tornou-se efervescente.
A Revolução cervejeira no Brasil
No Brasil, os pioneiros viam nessas cervejas um mote de revolução contra as gigantes. Era David contra Golias, uma batalha épica. Lá atrás se dispuseram a entregar aromas e sabores até então inéditos em terras tupiniquins. Soubemos como poucos fazer o mercado das artesanais acontecer. Os meros menos de 1% começaram a embalar e em pouco tempo já eram 3%, segundo alguns dizem.
Um número significativo de cervejarias começaram a surgir no cenário nacional. Alcançamos mais de mil cervejarias no país em um pouco mais de 10 anos de crescimento vertiginoso. Um marco histórico, com esforço próprio, sem ajuda de isenção fiscal que tanto é fornecido para os grandes grupos.
Algo não está certo
Subimos em número de cervejaria, mas os 3% continuaram 3%. O que estava ou está acontecendo?
O fato é que estagnamos. As grande começaram a comprar as “nossas”, entraram no nosso mercado e nós nos conformamos com isso. Alguns até aplaudiram como uma grande mudança positiva. Como um escravo liberto que diante de ter descoberto tanto do mundo livre, resolve voltar para a sua senzala e fica aplaudindo o “senhorzinho”.
E talvez aí esteja nossa característica de sermos sempre colônia, de nos contentarmos em sermos escravos libertos com umas migalhas. Não fazemos enfrentamento, alias nós os aplaudimos, fizemos festas, tiramos selfies das cervejas do senhorzinho!
Beer Influencer rendidos
No meio de toda essa revolução surgiram os beers influentecer. Pessoas, que como arautos, estavam dispostos a gritar as novidades para todos!
Mas eis que até esses se entregaram ao Big Brother. Alguns, agora tornaram-se arautos das grandes indústrias com suas propagandas das grandes cervejas de garrafas verdes, ou de marcas com duplos tipos de maltes (como se em uma cerveja artesanal não fosse comum, pelos menos dois tipos de maltes).
Aqueles que deveriam propor a mudança, estão acuados atrás do balcão
Espaços cervejeiros simplesmente deixaram, estão deixando ou se acomodaram ao fato de serem ditados pelos clientes. A velha frase “o cliente sempre tem razão” nunca foi melhor empregado aqui.
Ao invés de proporem mudanças significativas no mercado desafiando seus clientes a novos sabores e aromas, como os pioneiros faziam, se entregam a comodidade de vender infinidades dos estilos IPAs e as “lagers”.
Aliás, o estilo que foi a grande bandeira dessa revolução tem sido responsável pela acomodação do mercado e dos espaços de vendas de cerveja artesanal.
Os brewpubs estão fracassando a olhos vistos quando o negócio é propor mudanças culturais na cerveja. É tudo IPA. Caem, e continuam caindo na senda de vender IPAs e lagers comuns para não se incomodar para propor uma transformação cultural da cerveja.
O que pode ser feito? Onde está a tal “cultura cervejeira” que parece ter se tornado uma eminência parda, algo como um espírito velho que só conversa com sábios anciões que não descem até os meros mortais para difundir a boa nova.
O fato é que estamos acomodados, quietos, como uma pedra no sapato que se acomodou e que é melhor deixar assim que mexer.
Talvez, apenas talvez exista algumas saídas
As casas de cervejas, brewpubs e cervejarias devem propor ações conjuntas de educação cervejeira. Sair de trás do balcão e ir para a frente, conversar e educar seu público. Propor cultura por meio de sensibilização e treinamentos.
E não precisa reinventar a roda, tem muita gente e espaços já se propondo isso. Há muitos profissionais dispostos a oferecer serviços de melhoria em atendimento e qualidade de serviços na área das cervejas artesanais.
Mas não só fazer isso. Levar cultura, cultura cervejeira de fato é levar para universidades, faculdades, espaços culturais artesanais, feiras, não só de cerveja, mas feiras artesanais.
Pertencimento
Mais do que fundamental é propor uma campanha maciça da importância de beber com qualidade, além da importância do beber local, do beber e fomentar empresas genuinamente locais, com compromisso com sua comunidade e não um alienígena externo ao meio onde essa comunidade vive.
O mais importante é essa identidade, esse “pertencimento”, acima de tudo uma criação de vínculos afetivos com cervejarias que existem por conta de seu meio. Sem isso, sem esses elos importantes vamos continuar perdendo.
Então a questão é sempre uma pergunta: De que lado você está?