Essa é uma frase comum pra quem é sommelier e atua na área ou está começando.
Avaliar a qualidade da cerveja, seu perfil e características dentro do estilo produzido, até mesmo identificar possíveis falhas e suas soluções faz parte de um dos trabalhos de um sommelier de cervejas.
E muitas vezes me incomoda o que se tem praticado no mercado com a digitalização do trabalho. Hoje é quase impossível conhecer um sommelier que não esteja online compartilhando suas experiências (tem gente que quer só o close não é mesmo?) e trabalhando com marcas e publicidade. Tem muito mais por trás disso.
A verdade é que se criou uma ideia de que o nosso trabalho vale uma caixa de cerveja, e que é disso que a gente vive, de receber em cerveja. “Eu posso te pagar em cerveja? tom de brincadeira esperando o aceite”. Isso é muito comum, não vejo nada de errado em quem veja vantagens nesse formato e dependendo da situação, posso analisar e entender os benefícios, é claro.
O problema é quando se banaliza o trabalho do sommelier, acreditando que receber em cerveja e gratidão é suficiente, que se faz por amor à profissão e ao mercado. É claro que gostamos de contribuir com o crescimento do mercado, mas isso também não vai acontecer se seguirmos desvalorizando nosso trabalho em troca de cerveja ou trabalhos para “divulgar” nosso trabalho.
Há situações e situações, precisamos analisar cada caso e como pode ser vantajoso para os dois lados e não dá pra julgar de fora a motivação de cada profissional para escolher trabalhar de graça ou por cerveja para uma ação, eu mesma me incluo nessa avaliação. A questão é que não é saudável que isso vire o normal do mercado.
Eu mesma já me ofereci para algumas ações voluntárias para ganhar experiência ou conhecimento e isso partiu da minha iniciativa e vontade de aprender e crescer, mas não posso fazer isso para a vida toda se desejo viver disso.
O que se envolve em torno disso é ainda pior e me faz refletir muito meu papel no mercado. A gente acaba criando um medo de cobrar por nossos serviços, de cobrar muito e não ganhar o trabalho, de cobrar muito e alguém fazer mais barato, de cobrar e o “trabalho” sumir e ainda de não ser chamado novamente.
Isso não é normal, esse medo que se forma de não saber quanto vale nosso trabalho e achar que sempre devemos fazer por um precinho camarada. A gente sabe que o certo seria dizer: “Olha, esse é meu preço, se não pode pagar também não posso fazer”. Mas na realidade a gente acaba com o receio de não ser mais lembrado e com o medo de perder oportunidades futuras.
Quanta coisa a gente faz de graça ou gastando do próprio bolso para fazer network e ter essas oportunidades futuras? Eu? Até hoje tô fazendo e me perguntando quando vou parar.
Sempre me questionando se outros profissionais estão passando pela mesma luta interna de se colocar no mercado, de ser lembrado para oportunidades que realmente valem a pena para viver da sommelieria.
O nosso segmento é feito de relações como todo outro, e tudo é uma questão de perspectiva. O que pode ser bom pra mim, pode não ser interessante para o outro, e cada sommelier irá poder descobrir o seu valor.
Um dia desses estava numa discussão num grupo de cervejeiras, sobre quanto cobrar para fazer uma ficha de avaliação de uma cerveja para identificar defeitos, indicar melhorias e encaixar o estilo num guia. Surgiram diversas respostas, de R$100 a R$350 por cerveja, ou cobrar por hora dedicada.
E no mesmo momento me vi pensando: “Nossa, nem tenho coragem de cobrar tudo isso, ninguém vai querer pagar, acho que nem sou boa o suficiente pra isso”. Um pensamento cruel, considerando o quanto a gente dedica tempo e estudo para este trabalho. A gente questiona a própria capacidade por não acreditar que vale o suficiente.
Eu compreendo que empreender no meio cervejeiro não é nada fácil, e que as cervejarias também passam por dificuldades de como melhorar os resultados e continuar ganhando espaço, mas todo mundo tem que sair ganhando pra coisa andar.
São reflexões diárias e necessárias, mas precisamos posicionar melhor nosso trabalho, como trabalho. Pode parecer divertido, e é! Mas continua sendo trabalho que requer seriedade e estudo.
Creio que essa dificuldade em saber quanto cobrar não seja exclusividade da nossa área, é uma luta de todo profissional autônomo. O reconhecimento da profissão de sommelier já é um passo para o desenvolvimento do mercado, mas ainda é preciso posicionamento por parte dos profissionais.
Trago essa reflexão porque quero compartilhar essa dificuldade minha, que creio ser de muitos. E as vezes falta coragem pra dizer: “Não me peça para fazer de graça, o que eu faço pra viver!”