No dia 20 de março, a Heineken fez uma postagem no Instagram que rendeu mais de 28 mil comentários.
A imagem de um copo de cerveja em meio a um mar verde de lúpulos em flor dizia: “20 de março. Dia Mundial sem Carne”. E na legenda: “Neste dia Mundial Sem Carne, que tal comer e beber mais verde? A cerveja feita com água, malte, lúpulo e nada mais é a opção perfeita para o acompanhamento de hoje.”
A postagem gerou comoção de todos os lados. Muitos comentários negativos, ofensivos, de boicote e outros de incentivo. Como:
“Vou comemorar fazendo um churrasco”
“Equipe de marketing fraca”
“Todos os dias SEM Heineken”
“Minha verdinha querida, sempre mais querida”
“Partiu churras vegan”
A maioria, dizendo que não consumiria mais Heineken nos churrascos como de costume, como forma de protesto. Alguns comentários, consideravam a postagem ofensiva para o mercado de carnes.
Agora vejamos, analisando a linguagem utilizada: “…que tal comer e beber mais verde?” não foi evidenciada nenhuma restrição ou indicação de que a marca não concorda com o consumo de carne. Me parece mais: tá aí um argumento para quem precisa consumir mais verde, beba Heineken. Ou aqui você tem a segurança de não ter insumos de origem animal, tá liberado beber. É esse tipo de mensagem que me passa, mesmo eu sendo consumidora de carne.
Claro, não posso falar por todos, mas em nenhum momento me senti ofendida com a postagem.
Agora pensando no cenário da pecuária brasileira, esse sim se sentiu ofendido, como vi em alguns textos de protesto, que identificam a postagem como uma forma de minar a indústria da carne que tem muita relevância no país e grande importância econômica e social.
Posso até tentar me colocar no lugar da indústria da carne: “poxa, o tipo de produto que é parceiro pro churrasco, não reconhece nosso posto”. Mas ainda não entendo como uma crítica ou forma de ataque. E mesmo que fosse uma crítica, sendo válida, porque não refletir?
Contextualizando, existe um movimento internacional que se iniciou nos Estados Unidos através de uma iniciativa da ONG FARM (Farm Animal Rights Movement), que criou o dia 20 de março como o Dia Mundial Sem Carne, além disso, esse movimento tem ganhado simpatia de diversas pessoas, que vem adotando a “segunda sem carne”, vista inclusive em diversos restaurantes. Esses movimentos tem objetivo de diminuir o consumo de carne, visto o impacto ambiental que ele traz junto.
Veja bem, o restaurante ou a instituição que adere ao movimento, não deixa de servir carne no dia, apenas oferece uma opção livre de carne, como forma de conscientização ou para ganhar respeito e aderência do público vegetariano ou vegano. Ninguém faz por ser bonzinho, nem a Heineken, nem a pecuária. Tudo é estratégia!
Agora vem a questão, será que essa estratégia foi pensada no público que consome a cerveja? Será que foi uma provocação proposital ou uma gafe que o marketing deixou passar?
Pesquisei em mais de 15 contas oficiais de Instagram da Heineken de diversos países e todos seguem uma espécie de agenda muito similar, campanhas iguais, globais, porém cada país tem uma abordagem a partir de suas particularidades, personalidades ou celebridades a frente. Nenhuma das contas que visitei tinha sequer uma menção do Dia Mundial Sem Carne, ou seja, foi uma escolha do time Brasil.
Mesmo que tenha sido uma gafe, uma necessidade de preencher o calendário de postagens como vi alguns falarem, a Heineken sempre se mostrou como uma empresa que faz provocações aos seus consumidores. Nós estamos falando da mesma empresa que há pouco tempo fez uma propaganda em que estimulava os homens a beberem seus drinks, e que as mulheres gostam de cerveja sim, mostrando que tem espaço pra todos, e na mesma época, eu vi algumas pessoas incomodadas com esse vídeo circulando.
Sinceramente, acredito que se uma marca tem potencial de se fazer ouvida, incomodar com assuntos polêmicos e importantes, é a grande marca. Empresas muito pequenas, não podem se dar ao luxo de perder consumidores por posicionamento (digo no geral, claro que tem nichos que já identificam um certo posicionamento).
Será que essa polêmica da marca vai diminuir o consumo e causar real boicote? Será que essas pessoas vão realmente deixar de comprar a cerveja para levar pro churrasco?
Esse ano foi publicada uma pesquisa pelo Credit Suisse chamada ‘Um gole de cerveja: entendendo as preferências do consumidor” que ouviu 800 consumidores de cerveja em 2020. Nela, foi identificado que a cerveja preferida do brasileiro é a Heineken, mesmo que nem sempre a compre, ele prefere ela!
A marca é considerada a cerveja preferida por 28% dos entrevistados, contra 13% da Skol, 12% da Brahma, 11% da Budweiser e 8% da Brahma Duplo Malte.
O que podemos pensar é que é preciso muito sentimento de vingança para não mais consumir a marca, será que o consumidor vai guardar tanto rancor ainda? Acredito que vai acabar caindo no esquecimento, a marca ainda ganhou a simpatia do público vegetariano e vegano que de alguma forma se sente incluído, lembrado.
Um dia depois da repercussão, a Heineken publicou no Instagram uma imagem com a cerveja no meio, uma salada de um lado e carne do outro com a escrita: “Um brinde ao respeito por todas as escolhas”.
Aqui, pra mim, mostrou que a marca se incomodou com os comentários, tentou mostrar que quer manter os dois públicos, mas me parece mais apagar incêndio, isso não estava planejado, com certeza.
Por fim, venho dizer que tudo isso é uma reflexão para nos fazer pensar mesmo, rever nosso consumo e de fato consumir da empresa que nos identificamos. As empresas estão percebendo isso, pesquisas têm sido feitas para identificar os tipos de relacionamento com o cliente, já que ele tem buscado cada vez mais conforto, confiança e emoções nos conteúdos, produtos e serviços que consome.
E se você é como eu, que adora discutir sobre isso e tem outras ideias, me chama pra bater um papo. Pode ser com churrasco ou salada, mas com cerveja, é claro. (Por enquanto, só virtual)