Cerveja em Foco

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Era pra moer só o malte

Contém acidez e não é de uma Lambic.

Nos últimos dias nos vimos obrigadas a assistir mais um episódio lamentável de como a indústria cervejeira é cruel e incomplacente com as mulheres.

Uma cervejeira dos EUA, Brienne Allan, que passou por uma situação em que teve sua habilidade de fazer cerveja questionada por ser mulher, se sentiu incomodada e postou em sua conta de Instagram @ratmagnet uma caixa de pergunta, onde perguntou para outras mulheres sobre situações sexistas que passaram em seus respectivos trabalhos na indústria cervejeira.

Imagino que ela esperava algumas respostas em sua conta de 2 mil seguidores, respostas de colegas e talvez algumas histórias já conhecidas. A surpresa foi que sua pergunta viralizou e fez com que mais de mil casos de assédio moral e sexual contra mulheres fossem compartilhados em um dia. Em 5 dias, sua conta chegou a 46 mil seguidores e ainda está sendo inundada de mensagens de vítimas.

Tudo isso gerou comoção e tomou proporções inimagináveis, nomes de cervejeiros e cervejarias renomadas foram citados, trazendo ainda mais polêmica. Os relatos expostos, inspiraram outras mulheres a compartilhar suas dores e gritar pelo direito de serem tratadas como profissionais. É pedir demais?

Pelo visto sim, pois o acontecimento tem atraído “haters” (ou apenas homens comuns incomodados com as acusações) que além de destilar comentários maldosos sobre Brienne e as vítimas, ainda jogaram pedras em um bar que se posicionou e realizou um evento em apoio à causa na Califórnia.

Por que isso parece tão comum para nós? Não faz muito tempo, passamos por uma situação semelhante no Brasil, em que um vazamento de mensagens de um grupo de Whatsapp com diversos nomes importantes do mercado cervejeiro, explodiu com comentários racistas, machistas e homofóbicos.

O caso ficou famoso e foi parar até no Fantástico, se falou muito por um tempo, alguns nomes foram sumindo, outros ficaram mais quietos e esperaram a poeira baixar para voltar e outros chegaram a ir à justiça.

Pra completar, o presidente da Abracerva estava envolvido nos grupos e depois de sua aparição no famoso programa de domingo, teve suas mensagens vazadas também, causando uma verdadeira reviravolta no cenário cervejeiro, culminando na renúncia de toda a diretoria da associação.

Isso mostra que ninguém tá livre de passar por isso? Não não, isso mostra que a mulher nunca tá livre de passar por isso! Seja em qualquer esfera, indústria, a gente tá sempre falando, pedindo pra ser tratada como profissional, por suas habilidades, competências e inteligência, não por gênero.

A gente cansa de pedir isso como se fosse um privilégio, pois não é. É item básico de respeito e ética para qualquer ser humano. Muitas vezes, a gente desanima, cai, não quer voltar, só pensa em desistir, porque tem que se expor pra fazer a sua voz ser ouvida. Lá vem a chata, falar de feminismo”. Infelizmente meu amigo, não dá pra parar ainda, então faça o sacrifício de aguentar a gente falando de igualdade, enquanto aguentamos as suas piadinhas, clube do bolinha e preferências profissionais por homens.

E tem que ser educada hein, não pode estourar, não pode xingar. “Tá naqueles dias”. Olha, todo dia estamos naqueles dias…os dias que não recebemos igual a homem no mesmo cargo, os dias que somos questionadas no trabalho por sermos mulheres, os dias que temos que provar que estudamos e temos domínio sobre o assunto, os dias que sabemos que um homem foi escolhido para seu cargo dos sonhos, mesmo tendo menos experiência.

Até quando vamos ter que ouvir que mulher não serve para trabalhar em cervejaria porque não consegue carregar peso? O que você está fazendo na sua cervejaria/bar que pode tornar a vida no trabalho menos perigosa para nós?

Eu sigo tentando explicar, falar de empatia, exaltar o trabalho de mulheres do meio e defender nossos direitos. Mas desanima, às vezes dá vontade de chutar tudo (literalmente).

E no fim, sabe qual foi a ação da Brewers Association (BA)? Oferecer desconto em uma empresa que oferece soluções de prevenção de assédio e suporte para os funcionários das cervejarias e bares associados. Não foi uma nota de repúdio (que não adianta nada, mas mostra empatia), não foi advertência e punição, não foi desligamento da associação. FOI UMA AÇÃO DE VENDA! Eles vão lucrar com a situação.

É só mais um dia sendo moída pela indústria cervejeira, e eu achei que era pra ser só o malte.

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